A postagem do dia 24 de julho de 2011, referente a fabricação de vinho caseiro é um dos artigos mais visitados no blog. Contudo nesta nova apresentação pretendo deixar a experiência de outros produtores e do conhecimento do tema adquirido em 24 anos de observação e degustação do vinho caseiro. A informação passada é a mais simples possível para a fabricação do vinho, mas não oculta segredos, e detalhada todo processo de forma verdadeira, mas também são incluídos os mitos populares.
No passado muitos moradores de São Bento do Sul, produziam seu vinho, com as uvas de suas parreiras. O tempo foi extinguindo os pequenos produtores sobrando poucos vinicultores, muitos conhecidos por décadas de tradição, embora nem sempre a uva de hoje é própria da região. As uvas geralmente são provindas do oeste de Santa Catarina: Tangará ou Pinheiro Preto. As uvas escolhidas são a Niágara Branca, Terci ou a Isabel.
É importante que as uvas colhidas, bem maduras, sigam para a adega o mais rápido possível, e neste caso a viajem noturna é a mais recomendada, para preservar as características da uva. A produção de uvas americanas, merecem a atenção para a melhor produção.
As uvas nobres, européias decifram notas de diferentes aromas como chocolate, cravo, ervas, terra etc. Mas no vinho caseiro feito de uvas americanas procura-se a simples apreciação da fruta, o gosto da uva.
|
Parreiras de uva - São Bento do Sul no passado |
PREPARAÇÃO DE BARRICAS
Uma semana antes de receber a uva é preciso preparar as barricas. Estas quando estão sem uso, ressecam pela temperatura ambiente e em alguns casos chegam a desprender as argolas de sustentação. É preciso colocar as argolas no local com a ajuda da quina de um martelo, prender a torneira e encher a barrica com água para a madeira inchar. Mantenha a circulação de água até parar o vazamento. Concluindo esta etapa é importante esgotar a água, secar no sol, por pelo menos um dia, e estar seguro que a madeira secou.
Complementação:Alguns produtores derretem parafina em uma panela e com a ajuda de um pincel revestem as paredes internas da barrica. Também constam que alguns produtores queimam enxofre na parte interna para matar microorganismos.
|
Barricas Santo Gofi - Rio do Areia - Mafra |
MOER A UVA
Recebendo as uvas as barricas já devem estar devidamente posicionadas em uma altura que permite colocar um balde abaixo da torneira. Os cachos inteiros são jogados em moedor de uva. Este moedor pode ter vários modelos sendo: Um rolo de madeira com pregos que ao ser girado manualmente empurra os cachos contra as paredes esmagando a uva. Também pode ter o formato com dois cilindros de madeira que pucham e esmagam os cachos entre eles. Estes cilindros podem ter estrias se intercalando como duas engrenagens.
Complementação: Alguns produtores debulham os cachos separadamente, retirando manualmente as bagas do cacho, para depois moer. Também existem produtores que esmagam as uvas com o moedor e depois retiram o maior número de talos dos cachos possível. Evitar amassar o cacho ou retirar após moer é a tentativa de melhorar a qualidade do vinho que fica mais adstringente com a presença ou esmagamento destes.
|
Gumercindo Eckel - Avencal São Pedro - Mafra |
|
Moedor com roda de pregos |
1 ª FERMENTAÇÃO
Nesta condição a uva fica dentro da barrica por cerca de quatro dias, dependendo do desenvolvimento da fermentação. As leveduras encontradas naturalmente na uva se multiplicam rapidamente fazendo a fermentação acontecer com o açúcar da própria uva. A fermentação separa as cascas do suco, sendo importante, pelo menos uma vez por dia, abaixar o chapéu de cascas para o mosto curtir. O local deve estar com boa oxigenação, sendo bem arejado, permitindo a liberação dos gases de fermentação.
Complementação: Alguns produtores colocam açúcar cristal na barrica, despejando no mosto, para aumentar a fermentação. Este açúcar formará o álcool. Alguns também utilizam o pé-de-cuba, onde uma pequena quantidade de uvas é esmagada e preparada sua fermentação dias antes de receber um lote maior de uvas para a fabricação, sendo incorporados na 1ª fermentação para acelerar o processo.
|
1ª Fermentação - Gumercindo Eckel - Avencal São Pedro - Mafra |
PASSAR PARA GARRAFÕES
Com a redução da fermentação na barrica o suco é retirado pela torneira, com auxílio de uma peneira e um balde, passando o suco para os garrafões de 40L; 50L ou 60 Litros. No primeiro dia ou ainda no segundo dia o garrafão deve ficar aberto, pois ainda vai expelir espuma pelo gargalo. Mas no terceiro dia deve ser fechado com um sistema que permite a saída dos gases da 2ª fermentação sem a entrada de oxigênio. O sistema mais tradicional é usar uma rolha de cortiça ou madeira perfurada para colocar uma mangueira, que fica direcionada em uma garrafa com água. A vedação da rolha pode ser feita com cera, mas é mais eficiente a massa de calafetar.
Complementação: Na retirada do suco da barrica o produtor que ainda não acrescentou o açúcar no processo, pode fazer nesta etapa, garantindo maior formação de álcool. Um dia antes da retirada é possível ferver o açúcar. O açúcar cristal é diluído em água e fervido até borbulhar. A proporção de açúcar é de 800gr a 900gr calculado para cada 10 Litros de suco fermentado. O açúcar fermentado deve ser incorporado ao suco fermentado de uva, em temperatura ambiente.
O garrafão pode ser fechado com “caneco” uma estrutura de madeira no formato de vaso com um tubo central. No vaso é despejado a água e fira-se um copo na água. Os gases da fermentação saem pelo tubo central, levantando do copo e liberando o gás. Alguns produtores jogam azeite para vedação do vinho com o oxigênio e neste caso não utilizam o método da mangueira ou caneco.
Não é necessário utilizar o garrafão, é possível utilizar uma barrica.
|
Gumercindo Eckel - Avencal São Pedro - Mafra |
2ª FERMENTAÇÃO
O vinho em fermentação permanece no garrafão por cerca de 3 meses, ficando neste até finalizar a fermentação, quando as pequenas bolhas não se manifestam mais. As leveduras morrem, o material em suspensão decanta, sendo necessário retirar o vinho para limpar o garrafão que no fundo apresenta cerca de 2cm de borra. Neste instante é importante evitar que esta borra levante novamente, pois vai “sujar” o vinho. É necessário retirar a rolha do garrafão. É importante amarrar uma mangueira de 2m com 1cm de diâmetro em uma ripa, mergulhar no vinho deixando afastado a mangueira em 2cm ou 3cm do fundo, sugar na outra extremidade e direcionar no balde. Lavar o garrafão com água e mangueira e fazer o vinho retornar para o garrafão com funil ou pelo mesmo método das mangueiras, utilizando a gravidade. Quanto mais vezes este processo for feito, melhor será o resultado, sem ter a deposição do material inerte no fundo da garrafa, após o engarrafamento e consumo final.
Complementação: Alguns produtores colocam cerca de 100ml de cachaça para cada 40 Litros de vinho, para evitar o retorno da fermentação. Também existem aqueles que acrescentam ácido salicílico para ter o mesmo resultado.
Nesta fase alguns preferem colocar 800gr de açúcar cristal puro ou fervido em água, para adoçar o vinho e trona-lo suave.
Para a fermentação não ocorrer novamente não pode ter açúcar e levedura, pois do contrário as garrafas irão estourar como espumantes.
|
2ª Fermentação - Gumercindo Eckel - Avencal São Pedro - Mafra |
ENGARRAFAR
É costume esperar a primeira geada para engarrafar o vinho, este pode estar pronto antes, mas as temperaturas abaixo de zero permitem uma cristalização e melhor definição de e menor acidez do vinho. Agora o vinho branco que inciou com o esmagamento da uva em um suco cor café com leite é transparente e cristalino, pronto para degustar. O vinho tinto de cor forte e tosca é brilhante, cristalino próprio para degustar. Os vinhos europeus são bons para envelhecimento, em poucos anos, e revelam diferentes paladares, mas o vinho caseiro de uvas amerinas precisa ser degustado jovem, pois perde rapidamente suas características, sendo a principal lembrança da uva madura no parreiral.
Complementação: O engarrafamento com rolha de cortiça pode receber cobertura de cera de abelha derretida com 10% de breu. Derretendo em fogo, basta virar o gargalo da garrafa, girar e suspender a garrafa em rotação, evitando escorrer a cera pelo gargalo. Alguns produtores utilizam apenas a cera de abelha e outros a parafina.
RENDIMENTO
Um litro de vinho precisa de 1250gr a 1350gr de uva dependendo da variedade da uva.
Saúde!!
O método apresentado é o mesmo utilizado pelos primeiros imigrantes de São Bento do Sul, sem as técnicas sofisticadas de mostímetro; densímetro; termômetro ou alcoômetro, tão pouco com uvas nobres ou equipamentos de controle de temperatura, tonéis aço inox, desengaçadeiras entre outros, também não foram considerados os conservantes anidrido sulfuroso etc. Mas é o vinho tradicional, que se perdeu com o tempo, em muitas famílias.
|
Santo Gofi - Rio do Areia - Mafra |
|
Gumercindo Eckel - Avencal São Pedro - Mafra
|